• contato@valadaresefueta.com.br
  • 21965450470

O emoji e a confiança nos contratos

Uma notícia recente sobre a assinatura de um contrato por emoji foi objeto de várias análises pela comunidade jurídica.

No caso, um tribunal canadense considerou o emoji do gesto positivo com o polegar como a aceitação do contrato: uma verdadeira assinatura e concordância com seus termos. Tal fato resultou numa condenação da parte que descumpriu o contrato no montante de 82 mil dólares canadenses, aproximadamente 61 mil dólares americanos.

A disputa girava em torno de um contrato de entrega de grãos. O vendedor argumentou que o emoji era simplesmente uma confirmação de que ele havia recebido o contrato, e não uma indicação de que ele concordava com os termos. Por outro lado, o comprador considerou o emoji como uma aceitação do contrato.

Com base na relação de negócios de longa data entre as partes e no uso anterior de respostas concisas pelo vendedor para confirmar contratos, o tribunal canadense decidiu que o emoji de "joinha" serviu como uma forma válida de assinatura contratual. O vendedor foi então condenado a pagar 82 mil dólares canadenses pelos prejuízos no descumprimento contratual.

Apesar da forma como o tema foi noticiado, o que me chama atenção neste caso não é propriamente o emoji ser considerado como assinatura de um contrato. O mais relevante é o contexto da relação negocial entre as partes e os costumes que prevaleciam nas tratativas entre as partes. O foco aqui é a confiança. Vou explicar melhor.

O cenário empresarial destacado pelo juiz canadense foi decisivo neste processo. Muitas vezes as conversas entre as partes tinham um tom informal, inclusive com piadas trocadas entre os interlocutores. Além disso, em outros contratos, a resposta suscinta do vendedor usando expressões como “ok”, “looks good” ou “yup” foi suficiente para que o contrato fosse efetivado e cumprido.

Neste contexto, o ambiente da relação comercial entre os empresários criou a legítima expectativa de que a resposta suscinta, ainda que por um emoji, seria suficiente para considerar o contrato como efetivamente assinado. A confiança foi o fator determinante neste processo.

E se esse caso fosse aqui no Brasil?

Considerando o panorama apresentado ao tribunal canadense, a solução para o direito brasileiro provavelmente seguiria a mesma linha. Isto porque os princípios da boa-fé e da probidade estão consagrados expressamente no nosso ordenamento jurídico. Ademais, vários institutos decorrentes da boa-fé são reconhecidos e aplicados pela jurisprudência pátria. As decisões fazem prevalecer a confiança e a legítima expectativa gerada pelas partes, ao mesmo tempo em que proíbem comportamentos contraditórios.

É exigência legal que as partes atuem de boa-fé. O padrão comportamental, em qualquer fase negocial, deve se basear na lealdade e na integridade de caráter. Com isso, os contratantes têm o dever de agir com lealdade e confiança recíprocas.

Portanto, a importância deste caso vai muito além de saber se o emoji é uma assinatura de contrato. A atenção precisa estar voltada para o comportamento costumeiro das partes nas tratativas negociais, levando-se em conta os elementos essenciais da relação comercial, a forma de comunicação tradicional entre os contratantes e as expectativas criadas e atendidas. Em última análise, o que importa é a confiança e a conduta legitimamente esperada pelos contratantes, considerando o histórico deste ambiente negocial. Isto sim vai definir como os negócios são realizados dentro daquele contexto específico.

Revendo a notícia, apesar do destaque na sua atuação, percebe-se que o emoji foi apenas um coadjuvante nesta trama jurídica.

Conversar
no Whatsapp